Hoje é um dia extremamente importante na vida da sociedade brasileira, dia esse em que, numa das mais significativas modalidades de exercício da cidadania, o povo brasileiro irá, pela instrumentalidade do voto, eleger os seus legítimos representantes: Deputados Estaduais, Deputados Federais, Senadores, Governadores e Presidente da República. É um dia de festa, celebração cívica das liberdades individuais, indisputável prerrogativa do estado de direito, amplamente assegurado por nosso ordenamento jurídico maior: a Constituição Federal.
Ao longo de toda a sua história, cuja cronologia atinge a jovem idade de pouco mais de cinco séculos, o Brasil viveu, no território político, angustiantes momentos de obscurantismo, até o instante em que a democracia se estabeleceu de forma definitiva, com o fortalecimento das suas instituições. Celebremos, portanto, o privilégio de poder escolher democraticamente as autoridades que irão nos governar.
Hoje é um dia, de igual modo, de séria reflexão, principalmente por parte daqueles que, resgatados por Jesus Cristo da escravidão do pecado, foram chamados para ser a luz do mundo e o sal da terra, testemunhas vivas do grande e transformador poder que há no evangelho da graça de Deus.
Considerando que o voto concedido tem grandes conseqüências para a vida da sociedade, é necessário que, na condição de crentes em Jesus Cristo, submetamos o nosso ato cívico ao crivo de uma maturada e bíblica reflexão acerca dos predicativos daqueles a quem estamos pensando em constituir como os nossos representantes. Devemos de modo criterioso e em humilde atitude de oração, examinar a vida dos candidatos em quem pretendemos depositar o nosso voto, tradução inequívoca da confiança que temos em sua capacidade de ação política e compromisso ético de fazer do mandato conquistado um instrumento de promoção do bem comum, e não um trampolim para o enriquecimento ilícito.
Aqui, a motivação do voto que vamos conferir deve ser rigorosamente avaliada à luz dos elevados e santos padrões que regem o reino de Deus: justiça, bondade, misericórdia, amor, dentre outros tantos que refletem o caráter de um Deus santo e que não exige do seu povo, em todos os segmentos da vida, nada menos que santidade. Para tanto, ele nos concedeu a mediação perfeita do seu Filho, a habitação santificadora do seu Espírito em cada um de nós e, por fim, a orientação segura da sua normativa, inerrante, infalível, inspirada e suficiente Palavra.
Nesse aspecto, devemos fazer do nosso voto um ato santo, que busca, prioritariamente, a glória de Deus, ao postular a eleição de quem verdadeiramente buscará transformar a sua atuação política em uma intransigente defesa e prática de um serviço republicano a favor de todos, notadamente dos mais fracos, dos que sofrem mais, dos deserdados de tudo. Quando votamos de costas para esses princípios emanados da Palavra de Deus, dando prioridade aos nossos egoísticos interesses (emprego, de preferência aqueles nos quais recebemos sem realizar qualquer tipo de trabalho, e outras vantagens circunstancialmente oferecidas), pecamos contra Deus, contra o nosso próximo e, ato contínuo, tornamo-nos tão corruptos quanto aqueles a quem vendemos as nossas consciências.
E, aqui, é conveniente destacarmos que a assertiva, segundo a qual irmão vota em irmão, muitas vezes, não passa de uma falácia competentemente arquitetada pelos que, em época de eleição, transformam os rebanhos evangélicos, com a anuência de líderes interesseiros e mal intencionados, verdadeiros lobos em pele de cordeiro, em verdadeiras massas de manobra, facilmente enredadas por toda espécie de manipulação. Muitos são os que, dizendo-se irmão, dão péssimo testemunho, não possuem vida efetiva nas igrejas das quais dizem fazer parte, e nas quais somente aparecem, cinicamente, para buscar o voto.
Hoje é um dia de oração. Um dia em que devemos, de modo especial, orar pelo país e pelas autoridades constituídas. Orar pelo país e pelas autoridades constituídas não é uma opção para a igreja de Cristo, mas um mandamento do Senhor. Devemos orar pelas autoridades a fim de que elas tenham o tirocínio necessário para governar com justiça e em favor do bem comum. E, também, conforme doutrina o apóstolo Paulo, para que tenhamos uma vida quieta e sossegada, sem o concurso de perseguições odientas que venham a obstaculizar a marcha e o progresso do evangelho, no tocante ao exercício, por parte da igreja, da sua desimpedida proclamação.
Hoje é um dia para, de modo mais concreto, desfazermos falsos conceitos insistentemente dominantes em algumas searas evangélicas, sendo um deles o que assevera que a atividade política pertence ao diabo, não devendo o cristão, em nenhuma hipótese, se envolver com ela. Ora, quem raciocina dessa maneira ignora, por puro desconhecimento das Escrituras Sagradas, o mandato cultural outorgado por Deus ao homem no ato original da criação. Crescer, multiplicar-se e administrar a terra, eis a ordem dada por Deus aos nossos primeiros pais.
Dentro desse contexto, estava, implícita, a atividade política, à luz da qual os homens buscariam engendrar modalidades governamentais capazes de promover uma vida comunitária harmoniosa, coesa, em condições de satisfazer às necessidades mais prementes de todos. Abster-se, radicalmente, da política, significa, de igual modo, não levar em conta a manifestação da graça comum de Deus, a qual, derramada sobre todos os homens, volta-se, entre outras, para todas as esferas da desbordante vida cultural das sociedades, dentro da qual a política pontifica como uma das mais relevantes.
Embora a tradição reformada reconheça que somente pode haver radical transformação na sociedade quando o homem, que a habita, experimenta o poder regenerador do Espírito Santo, ela não fecha os olhos para os melhoramentos sócio –econômico – político - culturais advindos de governos e de ações emanadas da sociedade civil que, estribados nos princípios bíblicos da justiça social, caminham em favor da promoção do bem comum.
Basta nos recordarmos, como lapidares exemplos do que estamos asseverando, de João Calvino em sua ampla ação político – pedagógica - espiritual na cidade de Genebra, e de Wilberforce em sua ingente luta contra o flagelo da escravidão na Inglaterra do século dezenove, para nos darmos conta de que somos chamados para glorificar a Deus em todas as coisas que fazemos, inclusive na seara da política, uma das mais nobres atividades humanas, dentre as muitas que integram as civilizações; nobre porque emanada do Deus santo das Escrituras Sagradas.
Hoje é, por fim, um dia de participação cidadã. Uma cidadania plena não se esgota apenas no ato do voto. É necessária que a ele se acresça uma consciência vigilante capaz de acompanhar os passos daqueles a quem, democraticamente, conferimos um poder transitório. Agir de forma contrária é dar atestado de alienação política e de insciência bíblica.
O cristão, salvo por Jesus Cristo e feito morada definitiva do Santo Espírito de Deus, tem a mente do Filho de Deus e é guiado pela suficiência das Escrituras Sagradas. Todo o seu sistema de pensamento e de ação deve estar moldado pela Palavra de Deus. No ato de votar, não deve ser diferente. Que no dia de hoje, ao entrarmos na cabine para o exercício do voto, o façamos na dependência e orientação do Senhor, buscando, em primeiro lugar, a sua glória e, depois, o bem daqueles que foram criados à sua imagem e semelhança.
José Mário da Silva - Presbítero da Igreja Presbiteriana do Brasil – CG/PB
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